domingo, 17 de julho de 2011

Pequeno sonho




Sonhei, por mais de uma vez, alguma noite passada, ser um periquito. Desajeitado esse sonho, num sem jeito meu de ser tão pequeno e verde, mas gracioso dono de belas asas. E pressentia, ainda, no sonho, que era sábio como as corujas.
Para um amigo, sem muito tardar a manhã, contei sobre o sonho. Surpreendeu-me sua alegria ao perguntar interessado como se consegue um sonho assim, se por meio de ofício em duas vias, se por requerimento ao chefe direto.  Ficou cheio de vida com o sonho, esse meu amigo.
Fiquei feliz que o meu sonho fizesse algum sentido ou provocasse vontades. No entanto, calei-me. Não contei o fato de que eu, pássaro verde e miúdo, estava indisposto com o espaço também pequeno, ávido de brisa, árvore copada, vento sem norte e longas distâncias. Não quis contar que chilreava minha desalegria de não voar além da grade que me proibia o céu, toda a felicidade. 
Alguns anos depois, escrevi esse texto com as penas que tive de mim. Escrevi a minha cor engaiolada naquele sonho ruim e bom, segundo meu desentendimento ou a sedução e desejo manifestos pelo meu amigo.
Não sei ser pássaro. Embora eu goste tanto de voar e precise de largos espaços geográficos, não sei ser pássaro. Não me cabem o silêncio noturno na plumagem mole das sábias corujas, nem a inquietude do periquito sem lugar.
Pergunto-me se não foi o sonho uma metáfora, o meu desejo inquieto de liberdade. Um dia qualquer hei de procurar por um desses velhos que predizem a vida e lêem os sonhos como palavras cruzadas onde cada lembrança do sonho diz outros espaços, outras verdades.  
Resta, com prazer o digo, o olhar desejoso de meu amigo. A identificação – e até uma certa inveja, ouso dizer - para com a beleza de meu sonho, ainda que não de todo esclarecido. Seria mais fácil, penso eu, se a razão dos sonhos fosse apenas isso: um motivo para a vida dos amigos que se aventuram a ser corujas ou periquitos.



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