domingo, 26 de março de 2017

INFLAMADO

que este verso tenha os teus ombros largos 
sorria de boca inteira, lábios, cabelo, inteligência 
deixe no ambiente o teu cheiro másculo
e na memória os teus pés descalços
brincando com os meus, demoradamente 

que este verso tenha as tuas mãos firmes, teu olhar de macho
esse jeito enorme de me apanhar nos braços 
dizendo forte e bem dentro dos olhos
lindeza, amor e outros carinhos pequenos 
feito um grande querer que me queira sempre
 
que este verso tenha o amor com que me arrastas
o corpo incendiando vontades 
a alma querente insaciável 
até o ventre em que eu te tenha inteiro
no branco chão da minha página 
dessas palavras de inventamento 


Márcio Ares. 2017. 

quinta-feira, 23 de março de 2017

AMOR DE PALAVRA

prefiro aos carinhos pálidos
aqueles tímidos, sem eloquência, 
carinhos que assim mal se sabem 
um verso desavisado numa conversa fácil 
que, sem dar por isso,
me abrace eternamente

Márcio Ares. 2017 

terça-feira, 14 de março de 2017

MUITO EM PEDAÇOS

é gente curtindo a night, catando lata, recolhendo bituca 
é gente light e gente maluca 
gente que sabe, gente que ama, gente que amarga 
é gente como a gente 
gente que é gente e gente que assusta 



Márcio Ares. 2017. 

ALEGRAMENTO

no veraneio do sol cotidiano 
às margens de uma tarde bonita e muito antiga 
hospedou-se a vontade da alegria 
enquanto a estrada para sempre ficava 
esse inquieto e estranho mistério 
uma exata e eterna visita 
de esperas e acontecimentos 



Márcio Ares. 2017 

DESMERECIDO

a vida lhe cheirava a consultório dentário
onde a vida escorria feito um dente apodrecido
sem nunca ter se dado por satisfeita
sem jamais acolher alguma grande alegria
até que a alma, temendo ruir por inteiro,
até que a alma escapasse ilesa
daquele corpo que morria vivo


Márcio Ares. 2017.

SEM DIREITOS AUTORAIS

aquele era quem lhe dizia
coisas que eram só coisas
e mil coisas que eram poesia

e embora muito tarde
tivessem se conhecido
a lhe dizer os versos guardados
ele era o poeta que teria sido


Márcio Ares. 2017.

POEMA A DOIS

poderia o nirvana vir
enquanto ainda estou vivo
e só mais ou menos insano

a dor que persevera assim
de modo estranho e latente
não há de envelhecer em mim

padecer tem sido o único inferno
tudo o mais mastigo e invento
com a dor e os dentes que teimam
até quando eu puder existir


Márcio Ares. 2017.