segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

DESENCANTADOS



um verso deveras desperdiçado
seria encontrar Adélia Prado
num grande baile de carnaval 

a rima de prosa com a serpentina
a estrofe na farra com a Colombina
Pierrot sofrendo de mais sofrer
e ela vestida de amor feinho
um poema inteiro, alegre, sozinho
reinando pleno, depois do frevo
uma dona doida por assim dizer

Márcio Ares. 2016

sábado, 9 de janeiro de 2016

INTERMINADO



de repente o susto de um tempo que festeja
e essa tristeza chegante traz nos ventos de algum velho agosto
um jeito de amar que não terminou

a poesia da primavera ainda mansamente
sabe o risco iminente da raivosa tempestade
o horror que sente o que se quer distante

a força bruta de um galope contra o destino avança
e ecoa em desvario por repentinos sentimentos
o medo inquieto de um amor reinante
que nega ao inverno a mais eterna ilusão

e a força dos cascos é esse querer mais perto
o músculo pulsante no tempo da espera
o amor que atropela os repentes do espanto

Márcio Ares. 2016

QUESTIONAMENTO



Não ama demais quem ama o pai, eu sei.
Mas o silêncio de Deus cala a minha fé, diz coisas que eu não sei, faz gritar meus medos.
A noite que parte na manhã nascente é desejo, a palavra que falta no escuro da mente.
Tirai de mim, eu vos peço, a reticente vontade que há muito me condena.
Que eu desaprenda a infeliz orfandade da certeza contra o nada.
A vida seja de novo um divino presente.


Márcio Ares. 2016

RESILIENTE



qualquer dia, eu reajo, entenda bem,
já não me convence a dor
e, feito a semente que não deu flor,
abandono o destino de sempre

o azul em mim não se desaprende
meu bem querer ainda sabe amor

Márcio Ares. 2016

IGUALDADE



meio que você mesmo
mais que meio esquisito
nascido em chão de pobreza
batendo terno bonito
não sabe mais o respeito
esquece as voltas da vida
até que um dia se deite
no mesmo chão da desfeita
com as mesmas dores da vida


Márcio Ares. 2016

RECRIAÇÃO



existir, na terra, como os anjos nunca devem ser
talvez seja o que sempre se quis
ser infeliz entre as feras, sob um céu em pedaços,
rumo às coisas mais bonitas, doendo as dores mais doídas,
nos tempos do acaso da vida, querendo às vezes morrer

a certeza  não passeia de mãos dadas conosco, estou certo disso,
nem insiste em sermos outros no infinito de nós mesmos

o erro do pai é o quanto nos custa a vida
a promessa do filho
o difícil desafio do santo espírito
a vontade insana de Deus

Márcio Ares. 2016