segunda-feira, 4 de julho de 2011

Os modos de um homem


Sou homem de um modo estranho
gosto muito de bichos, um pouco menos dos homens
aprecio o novo, a neve, o nordeste, o longe
acho um lixo a música medíocre, nem por isso morro pelo Caetano
e dou minha vida por um bom show da Bethânia
não sou fã de internet nem mil conversas ao telefone
adoro velhos e desconhecidos, respeito meu pai, amo sem fim minha mãe
sou de pouco abraço, recebo amigos só de vez em quando
e fico mais brilhante sempre que os encontro 
meu lugar é  muito o mundo, não uma longa visita, uma noite insone,
e, para dormir encoberto, tenho estrelas sobre a cama

Sou homem, já disse, de um modo estranho
não verso etiqueta, gosto do escuro à luz de um poema
não anseio pelos mais vendidos, o silêncio é que me compra
o mar eu visito para um só mergulho como quem tem fome
de ser índio, piloto, africano, helênico
uma fome jagunça, meio Guimarães
acho O pequeno príncipe  um livro sem tamanho
e se leio Clarice eu vomito meus ondes
feito quem sabe, e nos conta, se é que me entende

Sou homem, insisto, de um modo estranho
não digo palavra a quem só tem certeza
não sei perdoar nem que eu tenha outra vida
acredito em Deus e alienígenas
sou meio cego de um olho, o outro é uma beleza
e a quem me olhar meto as caras, ainda que seja o amor  esquisito
pras bobagens da televisão fico seco sem surpresa
aprecio filmes de arte, mas não dispenso uma ficção
o espaço me comove enquanto a vida é meu segredo
a verdade em que eu me dano é todo o tanto que eu existo 
e sendo assim desse modo eu fui por certo abduzido
vejo é no olho do outro esse homem tão estranho


Márcio Ares. 2010.

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