domingo, 24 de julho de 2011

Apoético




Quando não se é poeta
um nome não é mais que um nome
o homem não se faz de versos

Quando não se é poeta
a chuva caindo não é água penteada
a cor voando não é borboleta de asas
um texto não é filho partindo
saudade não é mal sem jeito
ficar não é por acaso

Quando não se é poeta
solidão não é bom destino
o silêncio não é sem horário
a hora não redime a espera
a carne não exige um verbo
dizer não engravida a virgem
a palavra não é só o que resta

Quando não se é poeta
a falta não inventa o crime
a vida não dói sem onde
o escrito não prediz o feito
o moderno não é Deus calado
um amor não pode ser de longe
morrer não pode ser mais perto

Quando não se é poeta
o medo não condena o sonho
a manhã não renova o drama
ser novo é não lembrar o outono
tristeza é não saber mais cedo
perder é não estar ganhando
ousar é não jogar no incerto

Quando não se é poeta
a nuvem não forma figura
fronteira é não vencer o muro
estrada é nunca estar completo
existir não promete angústia
transcender não requer astúcia
esquecer não ilumina a fé

Quando não se é poeta
saber não é um ser sozinho
viver não é sofrer deserto

Márcio Ares. 2007

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