segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Morte e vida severina




Sem tamanho é tomar a dor de uma gente e dizê-la encanto, em verso, prosa e dança às muitas gentes de um outro tempo.
Dizer essa dor, em cena, no entanto, não é só lamento; é alegria de busca, de promessa, de encontro. Dizê-la a este mundo que se cala, quando gritar é urgente, é o que faz Pedro Paulo Cava - que de novo não se basta e, bonito e pronto, se reinventa.
Escorre, em nossos frágeis olhos de gente futura, a coragem bruta, de morte e vida, a lágrima seca, severina terra de um viver incerto, inseguro, descontente. A fuga é o desencanto de uma outra e mesma gente que não se desculpa da verdade posta; e cava muito fundo outra sorte.
Tanta voz é mais que martírio. É de beleza que se chora.
De canção em canção, de momento em momento e de cena em cena – além do Pedro, além do João, além do Chico - temos um torrão concreto de felizardos artistas doando-se ao chão do mais miúdo detalhe trincado de muita existência.
É a voz que não redime a dor, mas que sustenta a paixão que se sente, que ironiza enquanto se mostra, que diz a que vem. E que às vezes faz rir, mesmo quando dói.
Dá licença o canto exposto para o bom gosto de alguma outra aparente estranha melodia: “carcará”, que toma pouso no canto presente; “súplica cearense”, tomada de súbito à voz de todo esse orquestrado elenco, feito um rio que se vence e que em mil almas se molha; "fica mal com Deus" que diz a fé de uma força que nunca se cansa e "asa branca", esse voo de terra e de longes que faz tão perto todo esse arranjo.
O rio nasce num seco de voz e vontade, o corte da corrente, destino de outras águas. E segue a vida a morte, a brisa de uma gente encorajada no assombro desse espetáculo que não tem hora.
Fica é a gente sem leito, sem saber chegar. E vamos ficando foz que ainda chora essa terra de querer e ir embora.
Esse mar, essa voz que agora faz lembrar o longe e mais belo da história, banha a alma de quem chega seco, insiste, e fica à mercê de algum pronto recife, náufrago de vida e morte, terra e lugar, severina sorte.

Márcio Ares, 2011.

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