sábado, 1 de setembro de 2012

ENTARDECER


O céu ainda existe azul sobre a cidade.
Nos galhos do poste pousam tristes e miúdos pássaros.
As grades, feito sempre-vivas, alastram-se pelas casas,
com a força bruta de uma verdade arrancada ao inverno de muitas almas.
E flores há em uma ou outra janela.

Morre, asmático, o ar cimentado de asfalto e vizinhos alados.
De amor esquecido o bem-querer se revolta e se cala.
Cegos, surdos, e já sem nenhum olfato, perdem-se o tato e o paladar.
Feliz o termo saudade, o ideal tempo que era antes do concreto.
E a solidão se agarra ao azul que ainda resta desse pouco céu
amante silenciosa da mais plena memória das árvores.

Qualquer poesia que se invente é de um tempo encarcerado.
Dói por enquanto o que mesmo antes era um pouco tarde.
E o que muito mais agora se apresenta
são muros e lamentos dessa pálida cidade.


Márcio Ares. 2012.

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